Quando atendeu ao telefone para receber meu pedido de entrevista, o ex-senador Mário Couto, 72 anos, foi logo disparando: ‘um amigo me disse que você pensa que eu não gosto de você... Rita, essas são coisas da política’.
Mário Couto se referia à série de matérias feitas por mim e publicadas no jornal Diário do Pará sobre corrupção na Assembleia Legislativa do Pará no período em que ele havia presidido a Casa.
As manchetes eram respondidas na tribuna no Senado com agressões à família Barbalho, proprietária do jornal.
Aceita a entrevista, o ex-senador me recebeu em sua residência em um condomínio de classe média alta na Região Metropolitana de Belém. O prédio de dois pavimentos, pé direito alto e porcelanato brilhante parece um comitê de campanha. A toda hora chegam políticos e correligionários. Ao responder a idade, Couto indaga bem humorado: “não parece que eu tenho 50?”. Conta que tem feito musculação e box e afirma estar pronto para disputar uma vaga ao Senado, cargo que julga ter perdido por ação direta do atual governador Simão Jatene de quem não esconde a mágoa.
Nesta entrevista exclusiva, Couto fala de sua saída do PSDB há quatro anos, comenta acusações de corrupção e diz quem é seu preferido para o governo do Estado.
O senhor será candidato neste ano?
Sim. Serei candidato ao Senado Federal
E quem é seu candidato ao governo?
O meu candidato ao governo .... a gente (o PP partido onde está filiado há um ano) está conversando há muito tempo. Quando a gente está em um partido, não fica independente.
O senhor deixou o PSDB depois de 29 anos ...
Pois é... Fiquei lá por 29 anos. E acho que eu fui injustiçado pelo atual governador Simão Jatene que inaugurou no Estado do Pará a candidatura proporcional para o Senado, colocando mais de um candidato (na chpa governista ao Senado). Ele lançou cinco candidatos numa chapa só. Com isso, meu palanque eletrônico foi reduzido para 38 segundos e o candidato do outro lado, sozinho (refere-se ao hoje senador petista Paulo Rocha), veio com 6 minutos de televisão. Aí não tinha como ganhar a eleição. Tiraram todos os meus prefeitos, as minhas bases. E eu acabei entrando numa fria. Perdi a eleição, mas na verdade, o que queriam fazer comigo era me retirar da política.
Achavam que eu teria 40, 50 mil votos porque eu não fiz campanha não tinha partido, não tinha governador. Tiraram minhas bases, tiraram a minha condição de falar em televisão e eu fiquei na minha casa, não participei de eleição e tive 630, 640 mil votos sem sair de casa, isso mostrou que eu tava muito vivo na política.
Quem queria lhe tirar da política e por quê?
Quando o Almir Gabriel me chamou, e o Almir já tinha deixado o Pará, porque tinha perdido (a eleição ao governo em 2006) para Ana Júlia, ele disse que foi o próprio governador (Simão Jatene) que teria tirado o mandato de governador dele porque não o apoiou. Disse que ia apoiar e não apoiou, então ficou um sentimento muito forte no Almir Gabriel. Ele, ainda muito lúcido, achou por bem sair do Pará e foi morar em Bertioga (interior de São Paulo) e eu, senador da República, tinha um ônibus e viajava sempre para Bertioga aos finais de semana.
O senhor ia de Brasília para Bertioga de ônibus?
Ia de Belém.
Medo de avião?
Minha mulher ficou com pânico de avião e fiquei com pena da minha mulher, então resolvi fazer um transporte terrestre, e nós íamos até com filho de quatro meses.
Então o senhor ia a Bertioga conversar com o Almir ...
Conversava e ele queria porque queria que eu fosse governador do Estado. Eu falava ‘doutor Almir, o senhor não tem mais aquela liderança que o senhor tinha antigamente. Não dá para fazer isso, o Jatene tomou conta do partido, muitos não estão mais com o senhor’. Ele disse para mim: ‘eu tenho os deputados que eu fiz. Tetê foi eu que fiz; Ítalo Mácola ... Citou uma série de nomes.
Eu falei vá a Belém, se o senhor conseguir um deputado que apoie, aí eu sou candidato ao governo. Ele veio a Belém. Vinte dias depois, voltei a Bertioga e ele me disse. ‘Não tenho mais nada lá’. Mas o Almir era durão e começou uma rivalidade entre meu grupo com o Almir contra o do Jatene. Ele (Jatene) fez uma festança de aniversário e eu disse para minha mulher, com quem ainda não era casado, ‘vamos casar’. Ai nós colocamos umas mil pessoas na Assembleia Paraense. A única coisa que ele fez de bom para mim, foi ter feito eu casar.
E ele foi ao seu casamento não é?
Ele foi, mas se sentiu meio isolado. Demorou uns 15 minutos e foi embora. A competição continuou, foi dura. Um dia, o Orly Bezerra me procurou. Disse que a disputa entre nós iria levar à vitória da Ana Júlia. Liguei para o doutor Almir, ele não me atendeu bem. Desligou o telefone. Conversei eu e a Cilene (hoje deputada), minha filha, com o Jatene. Disse que ele não guardasse mágoas. Ele disse que partido é assim, que tinha sido uma boa disputa. Mas infelizmente ele guardou essa mágoa e me derrubou na eleição para o Senado.
Depois que saiu do PSDB, o senhor ficou longe da política?
Eu nunca deixei de fazer campanha. O meu trabalho é política. Minha casa é sempre aberta, meu escritório sempre aberto, atendo no escritório, atendo aqui em casa, sempre andando pelos interiores, fazendo trabalho comunitário, e a política nunca saiu de mim. Eu nunca deixei de ser político.
O senhor não pensou nem por um momento em deixar a política?
Eu pensei agora nos últimos anos. Não por estar sem partido, mas pela conjuntura política Brasil. Eu estive no Senado, vi quanto o pai s passou a ser essa lama de corrupção. Eu sabia que isso tava dentro do nosso Pais, é difícil combater. Fui uma andorinha isolada no combate à corrupção durante oito anos.
Voltando a pergunta inicial, quem será seu candidato ao governo?
Depois de um bom tempo sem partido, eu achei que os irmãos Beto e João Salame (ex-prefeito de Marabá) gozavam da minha simpatia. Vejo neles rapazes sinceros, honestos, e, como eu já tinha passado esse episodio com Simão Jatene, eu não queria que se repetisse isso pra mim. Eu queria segurança absoluta. Então eu conversei com eles e acharam maravilhosa a ideia de eu ir (para o PP). Conversei com minhas bases, meus prefeitos, todos acharam muito prudente e fui. Eu me sinto muito seguro, muito satisfeito, no PP. O candidato que eu vou apoiar é o candidato que eles apoiarem.
E se eles apoiarem um candidato do PSDB tem algum problema para o senhor?
Não há problema de nenhuma parte desde que a gente esteja integrado ao processo. Vou fazer a minha campanha dentro do meu partido. Agora eu não posso ficar contra o meu partido se não eu não vou poder disputar a eleição.
Relação com os Barbalho:
Houve um momento que a sua relação com o senador Jader Barbalho foi, digamos, beligerante. Hoje o clima entre vocês é mais amistoso?
Já teve (briga) na política. O Alacy brigando com o Jarbas Passarinho, Helio Gueiros brigando com o Jader e depois se uniram...
O senhor então está unido hoje com o grupo do senador Jader barbalho?
Não vou dizer unido com o grupo do Jader. Eu tenho uma relação muito forte com o Helder. Isso vem do tempo em que fomos deputados. Eu me reunia toda quinta-feira em Marituba no meu sítio. Depois do futebol tinha uma cerveja, pato, peixe...o Helder estava nesse processo.
Os irmãos Salames de Marabá também estão bem próximos do Helder...
Eles têm uma relação com todos os políticos paraenses. Eu não estou muito preocupado para saber para que lado eles vão porque, desde que eu tenha minha vaga garantida, para mim está tudo bem. Há um ano e meio, eu não queria mais política, mas eu vi que o Brasil começou a mostrar sinais de recuperação na corrupção. Eu lutei muito contra a corrupção. Se você pegar mais de mil pronunciamentos no Senado, vai ver que 99% desses pronunciamentos foram contra a corrupção.
Denúncias de Corrupção na Assembleia
O senhor foi investigado pelo Ministério Público?
Não fui. Quando apareceu o caso dos funcionários fantasmas, alguém me disse assim ‘vão querer puxar a tua administração’. Na política é assim desde os tempos de Cristo. Porque ele fazia o bem, curava, seus adversários começaram: vamos matar esse cara. O que é isso? É política.
A minha administração foi muito boa e muito forte. Minha reeleição ao segundo mandato para a Presidência da Assembleia foi por unanimidade. Quando chegou nesse assunto quiseram me puxar para o miolo do furacão, e aí começaram a vir manchetes. Mario Couto está envolvido com 23 milhões, 13 milhões na Assembleia. Isso me chocou. Era o jornal que tinha ligado ao nome do Jader Barbalho que era o Diário do Pará e a jornalista era você que está agora me entrevistando. Eu conversei com o Jader. Olha, Jader estão querendo me puxar para esse rolo. Ele disse: quem manda no jornal não sou eu, é o meu filho e foi saindo manchete. Aí era lógico e notório que eu tive que dar as minhas respostas. Isso trouxe essa desavença.
Mas o senhor tem consciência que as manchetes eram fruto da investigação do Ministério Público?
O Ministério público não fez uma investigação, ele fez uma acusação, tanto se você ver o processo que foi mandado arquivar, não foi encontrado nada a respeito da minha administração. Eu pagava por não ter visto 2.700 funcionários na Assembleia. Eu tinha que ver todos eles o que faziam, se não, o MP me denunciava. E olha que o juiz (que arquivou o processo) foi altamente criticado por mim.
E o caso da Tapioca?
Não fui eu quem fez o processo de licitação da tapioca. Eu não assinei. Pegue uma cópia e veja quem assinou esse processo. Eu estava viajando, assumiu quem devia assumir e fez o processo. Não fui eu que assinei. Qual foi o outro processo que me acusaram da tapioca?
Aquele envolvendo o time de futebol de Cuiarana
Esse é o mais engraçado do que o da tapioca, quem foi que disse isso, você sabe? Depois eu vou dizer quem foi. Isso é uma graça, mas eu pago até hoje. Só o tempo se encarregou de provar que eu não era bicheiro porque eu não consegui provar de jeito nenhum. Deram esse carimbo em cima de mim que eu não conseguir provar em toda a minha vida pública. O primeiro deputado que disse isso em plenário foi o Babá (João Batista hoje no PSol do RJ), eu brigando, discutindo com ele, ele disse: você é bicheiro, aí pegou. Vinte e cinco anos se encarregaram de provar que eu não era bicheiro.
Jogo do Bicho
Tem foto do jornal O Liberal antigo onde o senhor aparece ao lado de um grupo que esta apresentando reivindicações para um grupo de bicheiros.
A foto é verídica. Eu era amigo do Alencar (que foi dono da casa de shows Lapinha) e do João Bosco Moisés. Eles iam à minha casa até pouco tempo antes de morrer. O que aconteceu é que, de um lado, tinha e Escola de Samba Arco Íris e, do outro, o Rancho. Eu era dono da Arco Iris e o Rancho era do Bosco. Então o Alencar e o Miguel Pinho que já faleceram eram adversários do Bosco e começaram a frequentar o barracão do Arco Íris. Eles pagavam a folha semanal da escola de samba para fazer raiva para o Bosco, para o Bosco não crescer. Quem gostava disso era eu.
A escola de samba então era alimentada pelo dinheiro do jogo do bicho?
Como todas são. A briga era entre eles. Aí o Mário Couto fazendo uma cultura popular, ia dizer não, eu não quero dinheiro do jogo do bicho? Nunca joguei no bicho não entendo nada disso.
E a foto do jornal?
Eu ia ao Lapinha. Eu namorava no Lapinha, quem queria tirar foto minha, era só ir ao Lapinha.
Relação com Ana Júlia Carepa
Quando o senhor foi senador e a governadora era Ana Júlia, o senhor fazia críticas que transbordavam para a vida pessoal dela. O senhor não se arrepende dessas críticas?
A Ana Júlia apareceu como a salvação. Ela ganhou do Almir. Foi a primeira mulher governadora e o Almir deixou muito o Pará organizado. Ela tinha o presidente da República. Tinha tudo pra fazer um grande governo. No primeiro ano, eu não falei mal dela. Mas comecei a ver a violência no Estado. Os números eram menores que os de hoje, mas já alarmavam naquela época. Aí veio a história daquela criança de Abaetetuba que os presos estupraram queimaram o seio da menina de 12 anos com cigarro, eu vou procurar a governadora, sabe onde eu encontrei? Dançando carimbó no salão negro do Senado Federal. Aquilo ali me trouxe mal estar, me trouxe a certeza que a governadora não tinha capacidade para governar um Estado do tamanho do Pará.
Mas suas críticas não eram muito machistas?
Era uma crítica normal. Quando você assume um cargo público tem que ter respeito.
O senhor contou que frequentava o Lapinha
Mas eu não era nada. Eu tinha cinco lojas, era empresário, um dos caras mais ricos do Pará. Vendia cinco toneladas de ferro por dia. Brincava de fazer escola de samba pra gastar dinheiro.
Saída do PSDB e relação com Jatene
O senhor sofreu muito quando se desfiliou do PSDB?
Sofri, eu aprendi a gostar muito do Almir, rezo um terço todos os dias por ele. Ele é meu amigo, me emociono quando penso nele.
O senhor acredita que ele perdoou o governador Jatene?
Não. O Almir, na minha maneira ver, nos últimos dias não estava mais são. Já oscilava. Acho que o cigarro fez com que ele oscilasse seu raciocínio.Ele tinha um sentimento muito forte com relação ao Jatene. Ele morreu com uma mágoa profunda.
Ele morreu magoado com o senhor por não ter levado candidatura ao governo adiante?
Eu acho. Ele deu uma entrevista e quando falaram meu nome, ele disse ‘passa’.
A partir de agosto o senhor estará de volta aos palanques?
Sim, estou esperando que o meu partido bata o martelo. Acho que está mais para o lado do Helder.
O senhor está bem magoado com o governador Jatene não é ?
Não é mágoa. É a história. Recebo muita gente aqui. Não ouço uma pessoa que diga ‘eu gosto do Jatene. Ninguém gosta do Jatene. Nem o Megale (ex-chefe da Casa Civil e provável candidato a vice-governador na chapa governista).