O Brasil tem 52 milhões e 200 mil cães. Nas contas do IBGE, neste País há mais cachorros do que idosos e mais “totós” do que crianças. Não é por acaso que cresce tanto, por aqui, o mercado pet, dividido em quatro segmentos: alimentos (Pet Food), serviços (Pet Serv), medicamentos veterinários (Pet Vet) e cuidados com saúde e higiene (Pet Care). O faturamento do setor é o 3º maior do mundo, tendo chegado em 2017 a mais de 20,3 bilhões de reais.
O administrador de empresas Mauro Henrique Studart Militão frequenta este meio há décadas. Tornou-se referência, no Pará, em uma especialidade cujo acesso, embora não exija formação acadêmica, impõe anos e anos de prática e muito estudo. Mauro é handler, especialista em adestramento de cães, um profissional cada vez mais requisitado em um país onde quase a metade dos 65 milhões de domicílios abriga pelo menos um cãozinho.
Mauro Studart, diretor de Raças do Kennel Club do Estado do Pará, criador de rotweiller, um dos 104 criadores associados ao Kcepa, recebeu a REDEPARÁ no Canil Von North, de sua propriedade, para falar sobre esta profissão que soma conhecimento e paixão. Veja os melhores trechos dessa entrevista, concedida ao jornalista Nélio Palheta, com fotos de Elcimar Neves.
P- Quais as raças recomendáveis para cão de guarda?
R- Geralmente, os mais usados são o pastor-belga malinois, pastor-alemão, rotweiller, fila brasileiro, doberman. Existem outras raças, é um grupo de cães bem grande. O pit bull também é usado para guarda. Tem ainda o mastim napolitano, que é uma raça mais rara...
P- Para cão-guia, qual seria a raça ideal?
R- O golden retriever e o labrador retriever são os mais indicados, por serem cães muito calmos e terem uma aptidão muito grande para esse trabalho.
P- E quais seriam as melhores raças para o trabalho de segurança?
R- Particularmente, eu gosto mais da raça malinois, pela inteligência, pela elasticidade, por ser um cão muito fácil de trabalhar. Mas também o rotweiller e o fila brasileiro são cães muito bons para esse tipo de serviço. Quando se fala em cães de segurança para instituição, pastor-belga malinois e rotweiller são os mais usados.
P- Qual a idade recomendável para começar o adestramento de animais?
R- A idade ideal é o quanto antes melhor. Se for um adestramento externo, é recomendável após todas as vacinas serem ministradas, depois dos quatro meses. Com os cães da minha criação, eu começo o adestramento aos 19 dias, 21 dias, com alguns testes, e essa jornada perdura por um ano, um ano e pouco. Se for um cão para um trabalho específico, como faro, até guarda pessoal ou busca e captura, então esses cães começam muito cedo.
P- Em quanto tempo um cão está preparado para as diversas aplicações?
R- Um cão preparado para alguns tipos de esporte, como o agility, ou os game dogs, precisa estar na maturidade dele, com aproximadamente um ano e meio, dois anos, o que vai ser interessante porque as partes física e esquelética estarão formadas. Um cão de trabalho para forças de segurança, ele inicia em média com dez meses. Alguns cães já estão aptos a trabalhar com faro, com a parte de segurança... com um ano e meio, dois anos, estão prontos e aptos para tudo. Os cães de exposição podem começar a jornada com quatro meses numa classe inicial, e isso perdura por todo um campeonato. Às vezes esse campeonato demora dois anos, dependendo do objetivo do proprietário. Se for fazer um ranking, isso aí demora bastante tempo.
P- Quanto custa, em média, preparar um cão?
R- O custo de se preparar um cão para exposição não é tão alto. Nesse caso, gasta-se mais com a manutenção de viagens. Os cães viajam praticamente todo o final de semana, têm de ser suplementados, têm de comer uma ração super premium, têm de estar com acompanhamento veterinário. Nesses casos, o proprietário tem de estar dsiposto a gastar em média de 1.000 a 1.200 reais mensais, pra que esse cão consiga participar de algumas exposições na nossa região. Para entregar um cão de faro pronto, custa em média de 12 mil a 20 mil reais, dependendo desse tipo de faro, se é de entorpecentes ou de explosivos. Um cão de busca e captura ou guarda pessoal, em média, custa de 10 mil a 12 mil reais o treinamento completo ou o animal já pronto.
P- Existe uma raça mais violenta que a outra? O pit bull é violento?
R- Isso é um mito. Tenho contato com diversos pit bulls e posso dizer, por experiência profissional e de convivência, que são cães amáveis, são cães supertranquilos, Acredito que a responsabilidade de alguns incidentes que acontecem com essa raça é de pessoas mal informadas, que criam e usam esse cão para um benefício errado. Eles são cães dóceis, tranquilos, equilibradíssimos. Agora, quando são entregues nas mãos de pessoas erradas, por conta da popularização que a raça teve nos anos 90, ocorrem certos problemas. Mas só se caírem nas mãos de pessoas que não têm condições de criá-los, que não sabem o que fazer com eles e que potencializam algumas coisas da raça que são ruins. Em si, é um cachorro amável e tão fácil de trabalhar como quaquer outro cão.
P- Por que os malinois têm sido requisitados pelas forças policiais?
R- Primeiro, pela aptidão deles para diversos tipos de serviços, pela rusticidade, por serem muito adaptáveis a trabalhar no calor, no frio, no escuro, na água, onde você colocar. Depois, porque são cães extremamente resistentes e que preservam na origem deles um temperamento, um equilíbrio, coisas que são potencializadas nas ações de segurança. São cães que nao têm medo de altura, não têm medo de barulho. São bem mais seguros nessas situações de trabalho. Além disso, você consegue uma homogeneidade dentro da raça, dentro da ninhada, muito grande. No universo de dez cães, às vezes 7 ou 8 vão servir para trabalhar. Este é um diferencial dessa raça.
P- Quantos canis existem em Belém dedicados ao adestramento?
R- Existem alguns canis que trabalham especificamente com segurança privada e patrimonial. Existem também os que trababalham com forças de segurança, como os canis da PM, dos fuzileiros navais, da Guarda Municipal, da Aeronáutica, da Polícia do Exército. Há bons canis em Belém.
P- Quanto custa, em média, um filhote das raças mais requisitadas?
R- Um cão filhote malinois custa entre 3 mil a 5 mil reais. Os rotweiller, de 2.500 a 5 mil reais. Pastores alemães também estão nessa média. Cães de companhia, como o golden revivier, variam entre 2.500 a 3.500 reais. Buldogues franceses, que são excelentes cães de companhia, hoje eu acho que é uma das raças mais na moda, têm filhotinhos variando de 5 mil a 15 mil reais .Tem o shih-tzu e o zwergspitz, raças bem procuradas e vendáveis, em média entre 1.500 a 5 mil reais. Alguns exemplares da raça buldogue francês chegam a 15 mil reais o filhote. Depende da criação, do aperfeiçoamento genético, do investimento em importação feito pelos criadores.
P- Para ser handler, existe uma formação acadêmica?
R- Não existe. Nem para adestrador. É uma formação técnica. Infelizmente, também não há nenhum tipo de sindicato ou associação, fora os Kennel Clubs, para ajudar a regulamentação, mas existe uma luta grande de alguns profissionais querendo instituir o sindicato para ter respaldo jurídico e técnico. Para se tornar um handler, é preciso antes de tudo ter o dom. Não é qualquer pessoa que vai chegar, fazer um curso e se transformar num adestrador. É preciso entender um pouco de comportamento, de estrutura genética, de criação de cães. Muitas pessoas fazem um seminário e já saem se achando um adestrador ou um handler, mas não é por aí. A experiência, o contato com pessoas com formação, o estudo, isso vai melhorando o profissional.
P- O que esperar do mercado de pets hoje?
R- É um mercado muito grande. A cinofilia em si está em ascensão e não é só a criação. Envolve diversos setores. O de alimentação, o de medicamentos, os profissionais, dentre eles veterinários e farmacêuticos, é um mercado muito grande. Belem é um polo muito rico. As pessoas aqui gastam um bom dinheiro com cachorro. Têm cães caros. O crescimento do Kennel Club acontece hoje porque tem um trabalho diferenciado, que trará benefício local e nacional.