Inclusão
Foto: Thiago Gomes/Ascom Susipe
Na tarde desta quinta-feira (5), 80 alunos da Escola Municipal de Educação Infantil e Ensino Fundamental Rotary, no bairro da Condor, em Belém, participaram da primeira edição deste ano do projeto Conquistando a Liberdade na capital. A iniciativa do Núcleo de Reinserção Social da Superintendência do Sistema Penitenciário do Pará (Susipe) garante novas perspectivas para presos, que ganham a chance de reduzir a pena com trabalho e o diálogo com a sociedade.
"Um dos maiores problemas que enfrentei depois de ser presa e conhecer de perto a cadeia foi a superação da ausência da minha família. Há dois anos não vejo ninguém. Eles moram em outro Estado e não têm condições financeiras de me visitar. O projeto tem me incentivado a relatar essa experiência e me fazer refletir que a vida digna é a melhor condição que uma pessoa pode ter”, disse a interna Keriane Valetino durante a programação na escola.
Keriane está custodiada no Centro de Recuperação Feminino (CRF). Natural do Amazonas, desde os 19 anos ela iniciou uma aventura perigosa no mundo das drogas. “Entrei nessa vida da criminalidade pelo meu ex-companheiro. Ele já era traficante. Depois que foi preso, entrei e comecei a participar para ajudá-lo a sair da cadeia. Estava muito apaixonada e acabei me envolvendo sem pensar no pior. Quando decidi transportar a drogra para Belém, a Polícia Federal me abordou no aeroporto. Há dois anos estou presa”, relatou.
A conversa franca sobre o mundo do crime e suas consequências faz parte do "Papo di Rocha", uma ação preventiva do projeto, voltada principalmente aos adolescentes, mais suscetíveis à criminalidade. Eliseu Borges, 43, do Tocantins, está custodiado na Colonia agrícola de Santa Isabel e também convive com essa dura realidade. Há dois anos preso, o caminhoneiro entrou no mundo do crime por desequilíbrio familiar. Pai de três filhas, ele era dependente químico desde os 19 anos. “Nunca consegui me livrar desse vício, foi desastroso tudo o que passei, mas hoje, com o pensamento transformado, penso em recomeçar a minha vida. Quando sair daqui quero voltar a trabalhar”, afirmou.
Ressocialização – O projeto Conquistando a Liberdade é promovido pela Susipe, em parceria com o Tribunal de Justiça do Estado (TJE), Programa Pro Paz, Ministério Público, Defensoria Pública e Polícia Militar. Atualmente, cerca de 200 internos são atendidos, em 16 municípios do Estado. “Promover a prevenção nas escolas alertando os alunos e seus familiares sobre a vida do crime é fundamental, visto que vamos a bairros com altos índices de violência. Além disso, buscamos também conscientizar a sociedade acerca da necessidade de ressocializar o preso. Essa troca de experiência é fundamental, pois a sociedade precisa saber o outro lado do encarceramento”, explica o coordenador do projeto, Ércio Teixeira.
Fátima Rodrigues, 56, é servente da escola há 16 anos. O Papo di Rocha a emocionou. “Minha filha também está presa. É um sofrimento que envolve toda a nossa família. Nós também ficamos presos. Sempre digo aos alunos para buscar o estudo e ouvir os conselhos dos pais para viver honestamente, pois a vida do crime não compensa”, disse.
Cerca de 15 detentos fizeram serviços de limpeza e manutenção na escola, como trabalho de capina, poda de árvores, além de retelhamento e alguns reparos elétricos. Para o diretor da unidade, Severino Wilson, os benefícios foram satisfatórios. “Uma oportunidade única que a escola recebeu. Estávamos sem recurso financeiro há algum tempo, e essa manutenção veio em boa hora. Agora vou contar com os alunos para manter a escola preservada”, afirmou.
O juiz da 1ª Vara de Execuções Penais da Capital, Cláudio Henrique Lopes Rendeiro, também esteve presente no local e comentou a importância da ação na escola da Condor. “É especial para o Poder Judiciário estar em parceria com a comunidade. É um beneficio que atende todos, tanta a escola quanto os alunos e familiares. O Conquistando a Liberdade é uma oportunidade para diminuir a entrada desses jovens no mundo do crime, através de depoimentos reais desses internos”, concluiu.
O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) avalia o projeto Conquistando a Liberdade como referência nacional no modelo de reinserção social de presos no país. O projeto também foi um dos vencedores do Innovare 2013, que divulga e premia iniciativas inovadoras para a Justiça do país.
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