EM VIGIA




Foto: Carlos Sodré
Uma polêmica em Vigia pode causar um Cisma político-religioso-popular. A prefeita Camille Vasconcelos vetou uma lei aprovada pelos vereadores locais para tombar a Igreja de Pedra e impedir que o acervo artístico religioso local saia do território do município. O X da questão é a tentativa da Paróquia mandar peças de arte sacra e imagens de santos das igrejas de Pedra e da Mãe Deus – dois templos do Século XVIII - para Castanhal, onde a Diocese está montando um museu.
De arquitetura única no Norte do Brasil, a Igreja da Mãe de Deus é uma obra monumental deixada pelos Jesuítas em Vigia. Mas ao longo de séculos, a igreja tem sido dilapidada. A rica prataria está reduzida a duas ou três peças ainda usadas nos rituais da missa e das procissões; a maioria das peças foi roubada ou simplesmente surrupiadas por padres que atuaram na paróquia; o edifício está precisando de urgentes intervenções restauradoras. A Igreja de pedra, ter sido inacabada, é um monumento por si só, embora pobre de peças de arte. O município pouca e nenhuma ação desenvolvem para preservar esse patrimônio. A Igreja da Mão de Deus é tombada pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Cultural Nacional (Iphan), o que não evita os sucessivos furtos e a deterioração do prédio.
Apesar das perdas do patrimônio serem conhecidas desde meados dos anos 1960, só recentemente a Câmara de Vereadores se mexeu. Em sete de fevereiro de 2012 foi aprovada uma lei, sancionada pelo prefeito Noé Palheta, que criou um sistema de “Preservação e proteção do patrimônio histórico, artístico, ambiental e cultural”; incluiu ainda a criação do Conselho Municipal do Patrimônio Histórico e de Cultura e instituiu o Fundo Municipal de Proteção e Preservação do Patrimônio do Município de Vigia”, entre outras providências.
Ocorre que nem o Conselho foi instalado e nem foram tomadas as “outras providências. O Poder Executivo não implementou a lei. É omisso nessa questão do patrimônio histórico. Alguém tinha que agir. A Câmara agiu agora, novamente, com o meu projeto”, informa o vereador Renan Pinheiro Barros (PRTB), que em fevereiro conseguiu aprovar a Lei do Tombamento, vetada pela Prefeita Camille Vasconcelos.
A lei, de 20 de fevereiro passado “tomba como patrimônio histórico e artístico municipal a Capela do Senhor dos Passos (Igreja de Pedra)”. A lei foi mais além tombando também como patrimônios artísticos e culturais todos os acervos, incluindo documentos e peças sacras dos templos católicos localizados em Vigia de Nazaré.
LEI IMPEDE VIGIA CEDER PEÇAS PARA O MUSEU DE CASTANHAL
A iniciativa do vereador, aprovada por unanimidade em fevereiro, atinge o projeto do Museu de Arte Sacra da Diocese de Castanhal, que planeja enriquecer o acervo com peças das igrejas de Vigia. O vereador Renan Barros idealizou impedir que as obras de arte sacra saiam do município. E radicalizou ao inserir na lei que as peças sacras não sairão do município nem por “empréstimo, para qualquer finalidade, mesmo para exposição fora do território de Vigia de Nazaré”.
No artigo 5º, a lei diz: “O poder público municipal estabelecerá compromisso de cooperação mútua com representatividade da Igreja Católica para salvaguardar, valorizar, preservar e promover o uso dos bens móveis e imóveis do patrimônio histórico, artístico e cultural de propriedade da Igreja Católica, para uso exclusivo no território de Vigia de Nazaré”.
No dia 14 de abril, a prefeita anunciou o veto à lei, argumentando questões jurídicas e formais, alegando que o instrumento aprovado pelos vereadores “adentrou indevidamente na incumbência exclusiva do Chefe do Poder Executivo”, conforme reza o Art. 59, III da Lei Orgânica Municipal. Disse a prefeita que “o tombamento é ato administrativo” fundamentado em um decrete-Lei de 30 de novembro de 1937 (o documento não explica se o quase secular decreto é federal, estadual ou municipal). Alega ainda que a Câmara impôs ao Executivo ações que implicam gastos sem indicar, todavia, a fonte dos recursos.
O prazo para a Câmara apreciar o veto da prefeita venceu dia 23; no mesmo dia, a Procuradora Geral do Município, a advogada Marcela Macedo de Queiroz, solicitou, em nome da prefeita, que a apreciação fosse adida “até que se ultime no Poder Executivo o exame da matéria”. A rigor, o adiamento foi um acerto da Câmara com a Prefeitura: “Nós pedimos que a data do veto fosse retificado para que a gente (os vereadores) possa ganhar mais tempo”. A questão é o funcionamento do Conselho Municipal de Cultura, que até agora não existe. ”A lei de 2012 é uma lei morta. Isso é o mais preocupante; queremos a ativação desse Conselho”, diz o vereador Renan.
Em fevereiro passado, o anuncio intempestivo do pároco se transferir para Castanhal as imagens de São Domingos e São Bartolomeu Gusmão, do acervo da Igreja de Pedra, causou um alvoroço em Vigia e paroquianos regiram nas redes sociais nas redes sociais. E a iniciativa foi adiada. Agora, depois do veto da prefeita, o problema é ainda menos “católico”, mas desagrada, igualmente a Diocese.
BISPO LAMENTA AUSENCIA DE VIGIA NOM MUSEU
D. Carlos Verseletti, Bispo da Diocese, confirma que está sendo montando em Castanhal um Museu de Arte Sacra. Já foram investidos no projeto, de autoria de dois museólogos italianos, mais de R$ 100 mil. E informa que “só a Paróquia de Vigia ainda não contribui para o acervo”. Ele diz que será uma lacuna se Vigia se o museu não exibir nenhuma peça de Vigia. Acrescenta que “se tem alguém interessado na preservação do patrimônio histórico de Vigia é o Bispo da Diocese”. Em março, os dois projetistas estiveram em Vigia para conhecer a Igreja da Mãe de Deus e avaliar a reprodução, no museu, da pinacoteca que decora a sacristia do templo com mais de uma dezena de telas retratando passagens da vida da Virgem Maria.
O Bispo lamenta as condições em que se encontra o templo da Mãe de Deus. A precariedade é visível no forro da nave central, tantos são os sinais de infiltrações, goteiras e danificação do madeirame. “A igreja precisa de reforma urgente; o telhado está seriamente ameaçado; precisa de uma reforma total, mas o Iphan nada faz e nem deixa a gente fazer” – diz o bispo, sem rodeios.
Ele informa que a Diocese tem um projeto pronto para equacionar os problemas. Além da reforma do telhado, o projeto prevê adaptações da nave central, restauro do calçamento exterior, de pedras lavradas, hoje totalmente irregulares, e do piso de cerâmica dos coredores laterais e da sacristia.