SAÚDE

As mudanças na rotina causadas pelo cenário de pandemia mexeram com a saúde mental de adultos em todo o mundo. No Brasil, de acordo com uma pesquisa da Associação Brasileira de Psiquiatria, 89,2% dos psiquiatras entrevistados confirmaram o agravamento dos quadros clínicos de seus pacientes e 67,8% deles registraram novas procuras por tratamento. Acontece que não são apenas os adultos afetados por essas mudanças: crianças também estão passíveis de desenvolver problemas. Um estudo no Reino Unido aponta que os jovens que experimentaram a solidão durante a quarentena podem ter até três vezes mais chances de desenvolver depressão no futuro, por isso, os cuidados precisam ser tomados desde agora.
O psicólogo do Hapvida, Fabrício Vieira, explica que a depressão infantil pode ter uma predisposição genética ou ser proveniente de um trauma, cujas causas são multifatoriais. "Geralmente engloba situações do contexto familiar, comunitário, escolar, podendo envolver a pedofilia, a separação dos pais, o distanciamento ou a morte em relação a alguém da família, o bullying, e assim por diante", ele explica.
Agora, neste período em que experimentamos uma quarentena prolongada, que afeta a rotina de todos nós, o isolamento pode ser mais um fator de risco para o problema, conforme aponta o especialista: "Assim como adultos e idosos, as crianças também podem ter depressão. No caso delas, pode ser justamente por estarem mais isoladas, sem a rotina da escola, de atividades extra escolares, do convívio lúdico com outras crianças e até mesmo pela quebra do convívio com avós, tios, primos. Isso pode ir levando a criança a esta desestabilização emocional".
Entretanto, nem sempre é nítida a percepção de que a criança pode estar desenvolvendo um quadro depressivo, pois as mudanças no comportamento ou no humor podem ser facilmente confundidas com timidez, mau humor, dificuldade de aprendizagem, tristeza ou agressividade. "Essas alterações podem ser normais em determinada faixa etária, por isso o diagnóstico da depressão infantil é complexo e delicado", comenta Fabrício.
Tendo isto em vista, o médico reforça a necessidade de prestar atenção aos sinais que uma criança com depressão pode apresentar e explica como diferenciar o problema: "Os principais sintomas da depressão infantil podem ser percebidos quando a criança está se isolando de forma rotineira, se ela está irritada, triste, apática. Também podem ser indicativos a diminuição do interesse por atividades que antes ela gostava, a insônia ou o sono excessivo, falta de apetite, alterações de peso, expressões de auto desvalorização ou culpa, dificuldade no aprendizado, na concentração, além de ideias de morte e suicídio. Mas é importante notar se não é momentâneo, se ela vem apresentando esses sinais por um tempo considerável".
O psicólogo informa que o diagnóstico clínico da depressão infantil se baseia nos critérios estabelecidos pelo manual de estatísticas e diagnósticos de transtornos mentais, e costuma ser fechado a partir da observação de pelo menos cinco dos sintomas ditos anteriormente, levando em conta a sua durabilidade. "O que diferencia a depressão das tristezas do dia-a-dia é a intensidade, a persistência e a mudança nos hábitos normais da criança", afirma o médico.
Sobre a prevenção do desenvolvimento de depressão infantil, o médico reforça a importância da relação familiar, que os pais tentem evitar a superproteção, para que a criança desenvolva autoconfiança para solucionar seus problemas, mas que também saibam ser firmes na imposição de regras e limites, para que os pequenos desenvolvam a habilidade de lidar com negativas e frustrações, se tornando adultos mais tolerantes, pacientes, pacíficos e resilientes. "Por isso é importante que os pais tenham esse comportamento seguro, confiante, firme, para passar esse tipo de valor e princípio para as crianças. A relação de afeto, de compreensão, de esclarecimento, é muito importante na relação entre pais e filhos, para que as crianças tenham uma melhor prevenção à depressão", conclui o psicólogo.