EDUCAÇÃO
Foto: Divulgação
Escolher uma profissão nunca foi tarefa simples, mas em tempos de mudanças rápidas e novas demandas no mercado de trabalho, essa decisão se torna ainda mais desafiadora. Faltando menos de 50 dias para o Enem, muitos jovens enfrentam a ansiedade de decidir o futuro antes mesmo da maioridade. Em Belém e região, essa expectativa é ainda maior, já que as provas terão datas diferentes do restante do país por causa da realização da COP30. O apoio ou a pressão da família pode influenciar diretamente como cada estudante encara essa escolha.
A psicóloga Melissa Fecury, coordenadora do curso de Psicologia da Faci Wyden, explica que a família exerce um papel profundo e ambíguo nesse processo. “É dentro de casa que o jovem começa a formar suas percepções sobre o que é ‘ter sucesso’, ‘ter estabilidade’ e ‘ser alguém na vida’. Comentários, expectativas e exemplos dos pais acabam moldando, mesmo que de forma inconsciente, o que ele considera uma boa profissão.”
Para alguns adolescentes, essa influência se transforma em pressão. “Um sinal importante é quando o jovem demonstra sintomas de ansiedade, como desmotivação ou até reações físicas ao falar sobre o futuro. Em alguns casos, ele evita conversar sobre o tema por medo de críticas ou comparações”, explica Melissa.
A publicitária Lorena Bastos vive exatamente esse momento dentro de casa. Mãe de Maria Luísa, que vai prestar vestibular este ano, ela tenta equilibrar o papel de mãe com o olhar de profissional experiente. “Minha filha decidiu seguir na mesma linha que eu. Ela quer ser publicitária também, mas ainda avalia opções como jornalismo e design”, conta.
Lorena acredita que acompanhar o processo de perto é importante, mas sem transformar a orientação em cobrança. “A gente conversa muito sobre essas novas áreas e como a comunicação vem mudando. Quero que ela explore diferentes possibilidades, faça cursos, construa um portfólio variado e descubra, com o tempo, em qual área se identifica mais.”
Com 15 anos de experiência em agências, ela diz que procura compartilhar os desafios e as alegrias da profissão com transparência:
“Eu conto tudo pra ela, desde as dificuldades do dia a dia até as oportunidades que surgem. O mercado muda o tempo todo, mas se ela gostar do que faz, vai encontrar o próprio caminho.”
A linha tênue entre apoio e cobrança - De acordo com a psicóloga Melissa Fecury, o equilíbrio emocional é tão importante quanto a escolha do curso. “A influência familiar é positiva quando há escuta, diálogo e liberdade. Mas quando o jovem sente que precisa atender expectativas alheias, a escolha deixa de ser autêntica”, diz.
Ela destaca que há estudantes que escolhem a profissão para agradar os pais e, mais tarde, enfrentam frustração. “Quando a decisão é tomada apenas para atender às expectativas familiares, é comum ver arrependimento e até sintomas de estresse e desmotivação. A realização profissional está ligada ao propósito, e não apenas à aprovação externa”. Lorena concorda e diz que tenta evitar que a filha repita um padrão comum: o de escolher pelo retorno financeiro ou pela vontade dos outros.
“Acho importante entender o retorno financeiro que uma profissão pode oferecer, mas isso não é o fundamental. O principal é ela se sentir bem e gostar do que faz. Foi assim comigo escolhi pela vocação, não pelo dinheiro.”
*Uma geração em dúvida e em movimento* - Mesmo com mais acesso à informação, a nova geração enfrenta um cenário incerto. Um levantamento do Instituto Locomotiva, em parceria com o CIEE, mostra que seis em cada dez universitários (59%) escolhem o curso de graduação com foco em empregabilidade, enquanto 85% acreditam que a formação trará benefícios pessoais e profissionais.
Mas, na prática, a instabilidade ainda é grande. Dados da OCDE apontam que o Brasil é o quarto país com maior proporção de jovens de 18 a 24 anos que não estudam nem trabalham: 24% estão fora da escola e do mercado. Para Melissa, essa realidade reforça a importância de tratar a escolha profissional como um processo e não como um ponto final.
“O mercado é dinâmico. Mudar de área ou redirecionar a carreira é cada vez mais comum. O jovem precisa entender que essa decisão não é uma sentença, mas uma construção.”
Para lidar com esse momento, a psicóloga ainda recomenda que as famílias invistam em diálogo e acolhimento. “É fundamental que os pais validem as dúvidas dos filhos e compartilhem suas próprias experiências, sem impor caminhos. Quando há confiança, o estudante se sente mais à vontade para refletir e fazer escolhas autênticas.”
Lorena reforça o mesmo ponto de vista, mas a partir da experiência de mãe: “Conhecimento é a palavra-chave, tanto para os pais quanto para os filhos. É preciso entender o que desperta interesse neles, conhecer suas aptidões e respeitar seus limites. O diálogo é o que faz a diferença.”
Entre incertezas, pressões e descobertas, a escolha da profissão segue sendo um dos primeiros grandes testes emocionais da vida adulta. Mais do que decidir o que fazer, os jovens precisam aprender a escutar a si mesmos e as famílias, a oferecer apoio sem conduzir o caminho. “O equilíbrio entre informação, autoconhecimento e liberdade de decisão é o que torna essa jornada mais leve e verdadeira”, conclui a psicóloga.